Teatro Experimental do Negro ganha nova edição e reafirma seu legado na cena brasileira
Lançamento das Edições Sesc celebra os 80 anos do movimento fundado por Abdias Nascimento, recuperando memórias, registros e reflexões sobre o impacto do TEN no teatro e na luta antirracista
Redação - SOM DE FITA
11/6/2025




O Teatro Experimental do Negro (TEN), fundado por Abdias Nascimento em 1944, segue como um dos movimentos mais transformadores da cultura brasileira. O grupo, que surgiu em plena ditadura do Estado Novo, nasceu como resposta direta à exclusão sistemática de artistas negros dos palcos e à representação estereotipada de pessoas negras no teatro da época. Agora, em 2025, a força desse legado é reafirmada com o lançamento do livro “Teatro Experimental do Negro: Testemunhos e Ressonâncias”, uma obra que revisita e expande a edição original de 1966.
Publicada pelas Edições Sesc em parceria com a Editora Perspectiva, a nova edição marca as comemorações pelos 80 anos do TEN, propondo um mergulho profundo nas conexões entre corpo, território, memória e resistência. O livro resgata críticas, registros históricos e reflexões do próprio Abdias Nascimento, ao mesmo tempo em que abre espaço para novas vozes — artistas e intelectuais contemporâneos que reavaliam o impacto e a atualidade do projeto.
A obra se apoia naquilo que Abdias chamava de “pedagogia da cena negra”, um conceito que ultrapassa o teatro enquanto espetáculo e o transforma em ferramenta de conscientização, autoconhecimento e libertação coletiva. Como destacou o próprio Abdias em vida: “O teatro negro não é apenas arte — é uma forma de resistência e reconstrução de identidade.”
O livro que costura passado e presente
Mais do que uma simples reedição, “Teatro Experimental do Negro: Testemunhos e Ressonâncias” é uma atualização viva do pensamento de Abdias Nascimento e de toda a geração que construiu o TEN. O volume combina textos originais e novos ensaios, formando um panorama abrangente da importância estética e política do movimento.
As fotografias de José Medeiros reforçam a força visual e histórica do projeto, capturando expressões, corpos e gestos que simbolizam a potência do teatro como espaço de emancipação. Ao revisitar essas imagens e textos, a edição reafirma que as ideias de Abdias continuam ecoando na cena atual — em grupos, companhias e coletivos que mantêm viva a luta por representatividade e justiça racial nos palcos brasileiros.
A publicação também apresenta reflexões inéditas de nomes que hoje pensam o teatro a partir da perspectiva negra, reforçando a atualidade do debate. São vozes que reconhecem no TEN não apenas um movimento artístico, mas um ato político contínuo, que desafia a estrutura racial da sociedade e reivindica um novo imaginário para o Brasil.
O livro enfatiza como a arte cênica pode se tornar uma linguagem de contestação. Ao tratar o palco como território de disputa simbólica, o TEN abriu caminho para artistas negros escreverem suas próprias narrativas — e isso continua sendo um gesto revolucionário.



Fundado em 1944, o Teatro Experimental do Negro revolucionou a arte brasileira ao afirmar a identidade e a cultura afro-brasileira | Foto: Reprodução

Abdias Nascimento e a pedagogia da cena negra
A história do Teatro Experimental do Negro não pode ser contada sem destacar a figura de Abdias Nascimento (1914–2011), poeta, artista plástico, dramaturgo e ativista. Sua trajetória entrelaça arte e política de forma indissociável. Desde a fundação do TEN, ele buscou transformar o teatro em um espaço de valorização da ancestralidade africana e de combate às estruturas racistas que moldavam o imaginário nacional.
O conceito de “pedagogia da cena negra”, desenvolvido por Abdias, propunha que o teatro fosse usado como ferramenta de autoconhecimento coletivo, capaz de resgatar a dignidade e a autoestima do povo negro. Essa pedagogia atravessava não apenas a interpretação, mas também a formação dos artistas e a maneira de se pensar o público e o espaço cênico.
O livro, ao recuperar textos e reflexões de Abdias, mostra como essa proposta influenciou profundamente gerações seguintes — desde o teatro engajado das décadas de 1970 e 1980 até os coletivos contemporâneos que seguem reinterpretando o legado do TEN à luz das lutas atuais.
Além disso, a nova edição enfatiza a importância do TEN como movimento precursor da teatralidade decolonial, isto é, uma arte que rompe com padrões eurocêntricos e reivindica a experiência afro-brasileira como fonte legítima de criação e conhecimento.
O legado do TEN e sua atualidade no teatro brasileiro
Passadas oito décadas desde sua fundação, o Teatro Experimental do Negro permanece como referência essencial para compreender a história do teatro no Brasil e os caminhos da luta antirracista na arte. O livro “Teatro Experimental do Negro: Testemunhos e Ressonâncias” serve não apenas como registro histórico, mas também como convite à reflexão sobre o presente.
Em tempos em que o debate sobre diversidade e representatividade ocupa o centro das discussões culturais, a leitura dessa obra se torna ainda mais urgente. Ela nos lembra que o TEN não foi apenas um grupo teatral — foi um projeto civilizatório, um chamado à transformação estrutural da arte e da sociedade.
As ressonâncias do TEN podem ser sentidas em companhias como o Coletivo Preto, o Bando de Teatro Olodum e outros grupos que continuam a experimentar formas de expressão cênica ligadas à identidade negra, ao território e à espiritualidade afro-brasileira. Esses artistas mantêm vivo o ideal de um teatro comprometido com a liberdade e a justiça social.
O novo volume das Edições Sesc e da Editora Perspectiva reafirma essa herança, mostrando que, 80 anos depois, as perguntas de Abdias continuam em aberto — e necessárias. Como o próprio fundador do TEN provocava: “De que serve o teatro se ele não serve ao povo?”
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