PLANET HEMP encerra carreira com gesto provocador: jornal vira papel de seda
Banda transforma sua despedida em ato simbólico de resistência e criatividade, mantendo vivo o espírito contestador que marcou gerações
Redação - SOM DE FITA
11/5/2025




Três décadas se passaram desde que o Planet Hemp surgiu com seu primeiro álbum, Usuário (1995), uma mistura incendiária de rap, rock, crítica social e defesa da liberdade individual. Agora, o grupo carioca anuncia oficialmente sua despedida — e, como era de se esperar, o adeus veio acompanhado de uma ação tão ousada quanto o próprio legado da banda.
Nesta segunda-feira (3), leitores da Folha de S.Paulo foram surpreendidos ao encontrar uma página inusitada: um texto com a frase “Quem tem? Quem tem? Quem tem? Agora você tem”, seguido por um retângulo pontilhado para recorte. Mas o detalhe mais surpreendente estava no material: a página era feita de papel de seda, o mesmo usado para enrolar cigarros de maconha. Uma jogada simbólica e criativa que sintetiza a essência de tudo o que o Planet Hemp representou ao longo de 30 anos — provocação, irreverência e liberdade.
Um adeus à altura da história da banda
A despedida do Planet Hemp acontece dentro do contexto de uma turnê que celebra o encerramento de uma trajetória marcada pela mistura entre o discurso político e a contracultura. O show de despedida em São Paulo acontece no dia 15 de novembro, no Allianz Parque, e contará com participações especiais de Pitty, Seu Jorge, Emicida e BaianaSystem — nomes que, assim como o grupo, representam diferentes facetas da resistência artística no Brasil.
O gesto do papel de seda foi uma ação de marketing que rapidamente viralizou nas redes sociais, mas, acima de tudo, é uma declaração de princípios. Ao transformar o jornal em um objeto ligado à cultura da erva, a banda reafirma o discurso que sempre defendeu: a descriminalização da maconha, a liberdade individual e a crítica ao moralismo social.
Não é a primeira vez que o grupo surpreende o público com ações de impacto. Desde os anos 90, o Planet Hemp esteve na linha de frente de discussões sobre censura, repressão policial e o direito de expressão. “A gente sempre foi sobre liberdade. Musical, política, de pensamento. Não faria sentido encerrar de outro jeito”, declarou um dos integrantes em entrevistas recentes.
Trinta anos de luta, som e resistência
O Planet Hemp nasceu no Rio de Janeiro em 1993, formado por Marcelo D2, BNegão, Formigão, Rafael Crespo e Zé Gonzales. Misturando o peso do rock com as rimas do rap, o grupo rompeu barreiras e abriu caminhos para o que viria a ser o hip hop e o rock alternativo brasileiro nos anos seguintes.
Com letras provocativas e um discurso abertamente pró-legalização da maconha, o grupo enfrentou a censura e até chegou a ser preso em 1997, acusado de “apologia às drogas”. O episódio, que poderia ter encerrado a carreira de muitos artistas, apenas reforçou a imagem do Planet Hemp como uma voz de resistência.



Leitores da Folha de S.Paulo se depararam com uma página feita de papel de seda, usada como intervenção criativa do Planet Hemp | Foto: Reprodução

O disco Usuário, lançado em 1995, é considerado um marco da música nacional. Faixas como “Legalize Já”, “Mantenha o Respeito” e “Phunky Buddha” tornaram-se hinos da juventude que via no grupo uma representação legítima da contracultura urbana. Nos anos seguintes, álbuns como Os Cães Ladram, Mas a Caravana Não Para (1997) e A Invasão do Sagaz Homem Fumaça (2000) consolidaram a banda como uma das mais influentes do país.
Mesmo com períodos de pausa, separações e retornos, o Planet Hemp manteve uma base fiel de fãs e sempre soube se reinventar. Em 2022, o grupo voltou com JARDINEIROS, seu primeiro álbum em mais de duas décadas, recebendo elogios da crítica por abordar com maturidade e vigor as mesmas causas que o consagraram.
Um legado que vai além da música
Encerrar a carreira com um gesto simbólico como o “papel de seda” não é apenas uma provocação — é também uma forma de encerrar o ciclo reafirmando a coerência da banda com suas ideias. O Planet Hemp sempre foi mais do que uma banda: foi um manifesto, uma trincheira artística que inspirou músicos, ativistas e pensadores.
A despedida, portanto, não é um fim em si, mas uma passagem de bastão. O impacto do Planet Hemp está presente em novas gerações de artistas que carregam o mesmo espírito de inconformismo — de BK’ a Criolo, de Rincon Sapiência a BaianaSystem.
Ao longo de sua trajetória, o grupo deixou claro que a música pode ser uma ferramenta de transformação social. “A gente sempre quis fazer pensar. A provocação vem daí. Não é só sobre fumar, é sobre questionar”, afirmou Marcelo D2 em uma de suas falas recentes.
Com o show de despedida marcado para novembro, a banda encerra suas atividades deixando um recado claro: a rebeldia pode mudar de forma, mas nunca morre. E se o jornal virou papel de seda, é porque o Planet Hemp sempre soube transformar o óbvio em arte — e o simples em símbolo.
Um adeus que se transforma em semente
O gesto final do Planet Hemp é, ao mesmo tempo, despedida e renascimento. Ao devolver ao público o papel de seda — um objeto tão presente na sua simbologia —, o grupo reforça a ideia de que o movimento nunca pertenceu apenas aos palcos. Ele está nas ruas, nas mentes e nas vozes de quem segue acreditando na arte como forma de resistência.
Assim, o adeus não soa como fim, mas como um convite. Um convite para que novas bandas, novas ideias e novos gestos continuem a desafiar o status quo, sem medo da censura ou da contradição.
O Planet Hemp encerra sua história como começou: com coragem, humor e um toque de ironia. E, dessa vez, o papel de seda não é só uma provocação — é também uma lembrança de que a liberdade, assim como a arte, é feita para ser compartilhada.

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