“O AGENTE SECRETO”: Wagner Moura e Kleber Mendonça Filho reinventam o cinema brasileiro com humor e coragem
Selecionado para representar o Brasil no Oscar 2026, o filme une duas potências criativas do país em uma obra que mistura política, memória e fantasia com a assinatura inconfundível de Kleber Mendonça Filho.
Redação - SOM DE FITA
11/6/2025




O cinema brasileiro está vivendo um dos momentos mais intensos de sua história recente. Após “Ainda Estou Aqui” conquistar a primeira estatueta do Oscar, a nova aposta nacional é “O Agente Secreto”, parceria entre Kleber Mendonça Filho e Wagner Moura, que estreia nesta quinta-feira (6) nos cinemas de todo o país.
A produção, escolhida para representar o Brasil na corrida pela categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar 2026, chega envolta em expectativa — e entrega uma experiência que é, ao mesmo tempo, política, nostálgica e profundamente emocional.
Com quase duas horas e quarenta minutos de duração, o longa é uma aula de narrativa e atmosfera. Kleber Mendonça Filho transforma um tema pesado — a herança da ditadura militar e o apagamento da memória nacional — em uma jornada leve e provocante, cheia de ironia e humor. O resultado é uma obra que conversa com o presente sem abrir mão de olhar para as feridas do passado.
Wagner Moura dá vida a um herói humano e contraditório
Em “O Agente Secreto”, Wagner Moura interpreta um homem em fuga que retorna à sua cidade natal durante os anos 1970, em meio ao clima de perseguição e medo da ditadura. Seu personagem carrega o peso de um passado violento e de segredos que se revelam aos poucos, num roteiro que brinca com o suspense e o drama político.
O ator baiano entrega uma performance magnética. Cada olhar, cada gesto e cada silêncio parecem carregados de camadas — culpa, dor, ternura e resistência. É esse magnetismo que transforma o filme em algo maior do que sua própria trama. Como destacou uma crítica: “Sem o charme do ator, o filme dificilmente seria tão irresistível.”
O elenco de apoio também brilha. Udo Kier, veterano do cinema europeu, interpreta um imigrante que fugiu do fascismo, apenas para enfrentar o autoritarismo brasileiro. Já Robério Diógenes dá vida a um delegado nepotista que simboliza a corrupção sistêmica do período. Mas a grande revelação é Tânia Maria, descoberta por Mendonça em “Bacurau”. Aqui, ela vive uma figura maternal que acolhe um grupo de refugiados e ilumina a tela com sua presença poderosa.
Moura, em especial, sustenta a alma do filme. Seu personagem é o retrato de um país dividido entre a fuga e o enfrentamento. Ele representa a tentativa de sobreviver em tempos sombrios, mas também a busca por identidade em um Brasil que insiste em apagar o próprio passado.
Kleber Mendonça Filho e o poder de rir da dor nacional
Kleber Mendonça Filho é conhecido por usar o cinema como lente crítica para observar o Brasil — e em “O Agente Secreto” ele alcança um novo equilíbrio entre humor, política e fantasia. O diretor de “Bacurau” e “Aquarius” revisita a década de 1970 sem nostalgia excessiva, mas com um olhar irônico sobre os absurdos da normalidade em tempos de repressão.



Elenco de O Agente Secreto em destaque: Hermila Guedes, Licínio Januário, Wagner Moura, João Vitor Silva e Isabél Zuaa | Crédito: Divulgação

A mistura de gêneros é um dos grandes trunfos do longa. O filme transita entre o drama político e o realismo fantástico com naturalidade, explorando até lendas urbanas como a da “perna cabeluda”, figura folclórica recifense que ganha vida em cenas ao mesmo tempo assustadoras e engraçadas. Esse toque de surrealismo reforça o tom satírico da narrativa e evidencia como o diretor consegue transformar o medo em arte.
Há também ecos diretos de “Retratos Fantasmas” (2023), documentário em que Mendonça revisitou os cinemas de rua de Recife. Em “O Agente Secreto”, essa nostalgia se traduz em planos longos, iluminação quente e ritmo que convida à contemplação. É uma homenagem não apenas à cidade, mas à própria história do cinema brasileiro — feita com ternura e crítica em igual medida.
O roteiro, assinado por Mendonça, aposta na leveza para discutir o peso da memória. “Ao tratar uma premissa pesada com leveza, o roteiro transforma o que poderia ser um thriller previsível em uma reflexão mais humana sobre tempos anormais”, analisa um crítico.
O resultado é uma obra que diverte, incomoda e emociona. O espectador ri, reflete e sai do cinema com a sensação de ter assistido a algo que fala diretamente sobre o Brasil — e sobre o que o país ainda evita encarar.
O Oscar e o novo ciclo do cinema brasileiro
“O Agente Secreto” é mais do que um filme — é um símbolo do novo ciclo de confiança do cinema nacional. Após anos de desafios no setor audiovisual, a produção marca a consolidação de um momento em que o Brasil volta a ser protagonista no circuito internacional.
Selecionado para representar o país no Oscar 2026, o longa aparece entre os favoritos da temporada, ao lado do norueguês “Valor Sentimental”, do francês “Foi Apenas um Acidente” e do sul-coreano “No Other Choice”. A expectativa é alta, e especialistas apontam que Wagner Moura pode até ser indicado na categoria de Melhor Ator. A revista Hollywood Reporter afirma que “o brasileiro desponta como um dos prováveis indicados e até favorito na categoria”.
Mas, independentemente dos resultados, o impacto do filme já é significativo. A união de Mendonça e Moura representa um encontro raro entre arte autoral e alcance popular, entre a crítica política e o prazer cinematográfico. “O Agente Secreto” é o tipo de produção que prova que o Brasil não precisa imitar Hollywood — porque tem uma voz própria, singular e potente.
O desfecho ousado do filme também tem dividido opiniões. A mudança brusca de linguagem e ritmo na reta final quebra a estrutura convencional e simboliza o rompimento do país com sua própria história. Para alguns, é frustrante; para outros, é o toque de genialidade que transforma o longa em um manifesto visual sobre esquecimento e resistência.
“O Agente Secreto” reafirma a capacidade do cinema brasileiro de reinventar a si mesmo. É uma obra que diverte, provoca e emociona sem precisar recorrer a clichês ou fórmulas fáceis. Com um elenco afinado, direção ousada e um roteiro que ri da dor para sobreviver a ela, o filme prova que a arte continua sendo uma das formas mais poderosas de enfrentar o passado — e imaginar um futuro diferente.
Com “O Agente Secreto”, Kleber Mendonça Filho e Wagner Moura não apenas fazem cinema: eles constroem um espelho do Brasil — um espelho que reflete tanto as cicatrizes quanto o brilho de um país que insiste em resistir.
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