GUGA BAYGON transforma passagem da 103 Norte em mural dedicado ao underground de Brasília
Grafite celebra décadas de resistência musical e homenageia nomes fundamentais da cena punk, hardcore e metal do DF
Redação - SOM DE FITA
11/20/2025




A produção cultural de Brasília sempre se construiu fora dos grandes holofotes, sustentada por músicos, coletivos e artistas que mantêm viva uma cena paralela, ruidosa e independente. Na passagem subterrânea da 103 Norte, um novo capítulo dessa história foi registrado com tinta spray: o artista Guga Baygon criou um extenso mural dedicado a bandas e ícones do underground brasiliense, reunindo nomes do punk, hardcore, crust, thrash, death metal e outras vertentes que moldaram a identidade alternativa da capital.
A intervenção rapidamente chamou atenção de quem circula pela região, reacendendo discussões sobre memória, pertencimento e a força cultural que Brasília carrega para além do imaginário do rock dos anos 1980. Com um trabalho que mistura grafite, identidade visual urbana e referências diretas aos grupos retratados, Guga organizou uma homenagem que não apenas registra um pedaço da história, mas devolve à rua aquilo que sempre pertenceu a ela: a estética e a voz do underground.
A construção do mural e o papel de Guga Baygon na arte urbana do DF
O mural da 103 Norte nasce dentro de um contexto que já acompanha Guga Baygon há anos. Tatuador, grafiteiro e artista plástico, ele circula entre linguagens visuais que sempre caminharam próximas das manifestações urbanas, especialmente aquelas ligadas à música extrema e às subculturas de rua. O projeto, segundo ele, surgiu como uma forma de reconhecimento para aqueles que mantêm a cena ativa, muitas vezes sem apoio, sem estrutura e com visibilidade limitada.
Guga comentou que a ideia era registrar grupos que ajudaram a construir a resistência sonora da cidade. Ao longo da pintura, ele incorpora logos, elementos gráficos característicos de cada vertente e referências diretas ao universo das bandas. A estética escolhida não busca “embelezar” ou suavizar nada; o objetivo é manter as características cruas e diretas que fazem parte da essência dessas cenas.
Em entrevistas informais nas redes sociais, o artista reforçou que não se tratava de um projeto institucional nem de uma encomenda. O mural é espontâneo, realizado de forma independente, e feito com o mesmo espírito das bandas que homenageia — autônomas, intensas e movidas mais pela necessidade de expressão do que por retorno financeiro.
Ao ocupar a passagem da 103 Norte, o grafite reforça o diálogo entre arte urbana e música alternativa, transformando um ponto de circulação cotidiana em um espaço de memória para quem vive ou viveu a cena do DF.



Mural de Guga Baygon celebra bandas e símbolos do underground brasiliense, reunindo referências do punk, hardcore, crust, thrash e death metal — Foto: Reprodução

Bandas homenageadas: um panorama da diversidade do underground brasiliense
O mural reúne grupos que, cada um à sua maneira, ajudaram a fortalecer diferentes vertentes do underground local. Entre as homenageadas estão:
Besthöven, importante nome do crust/punk e reconhecido internacionalmente pela fidelidade ao som d-beat clássico.
Device, banda que mistura death e thrash metal com forte presença na cena pesada de Brasília.
Violator, talvez o nome mais conhecido nacionalmente da nova geração do thrash, mantendo ativa a tradição do estilo na capital.
Murderess, com influências de death e black metal.
Quebra-Queixo, histórico grupo de hardcore com forte atuação no circuito alternativo.
Death Slam, representante do death metal mais extremo.
DFC, veteranos do hardcore brasiliense e um dos nomes mais longevos da região.
Os Maltrapilhos, voltado ao punk rock.
Os Cabeloduro, referência do hardcore local.
Mais Que Palavras, banda de hardcore que marcou a cena dos anos 2000.
Macakongs 2099, banda que mistura hardcore e elementos experimentais.
Detrito Federal, clássico do punk rock do DF.
ARD, grupo punk atuante desde as primeiras formações da cena.
Volkana, pioneira banda de death metal com vocal feminino, considerada uma das primeiras do gênero no Brasil.
A escolha das bandas reflete décadas de produção underground que nem sempre aparece nos registros oficiais da música brasiliense. Enquanto o rock dos anos 80 ganhou livros, documentários e revisões históricas constantes, o punk, o metal e o hardcore seguiram sobrevivendo de forma paralela, muitas vezes restritos a zines, casas pequenas, coletivos e gravações feitas com poucos recursos.
O mural dá visibilidade a essa trajetória. Cada logo pintado carrega não apenas a identidade visual das bandas, mas também o reconhecimento pela persistência de manter vivos estilos que raramente encontram apoio institucional. Em Brasília, onde cada geração renova seu próprio circuito, o grafite funciona como documento, lembrando para quem passa que existe uma cena inteira pulsando fora da rota do mainstream.
A homenagem a Ulisses “Ulixo” e o reconhecimento das raízes do punk do DF
Entre todos os elementos do mural, um dos mais significativos é a homenagem feita a Ulisses, mais conhecido como “Ulixo”. Considerado um dos primeiros punks do Distrito Federal, ele foi responsável pela criação do zine “DF Caos”, publicação que registrou o início da cultura punk na capital e ajudou a documentar bandas, eventos e coletivos em uma época em que praticamente não existiam registros formais.
A homenagem não foi incluída apenas como um aceno nostálgico, mas como reconhecimento da importância documental e cultural que Ulixo representou. Seu zine, feito de forma totalmente independente, virou referência para quem buscava entender como a cena punk se organizava no Centro-Oeste entre os anos 1980 e 1990.
No mural, a imagem dedicada a ele destaca esse papel pioneiro. O gesto de Guga Baygon marca a passagem da 103 Norte como um pequeno arquivo a céu aberto — uma memória expandida que conecta gerações diferentes da mesma cultura underground.
Ao incluir Ulixo, o artista aponta para algo maior: a música é apenas uma parte do que sustenta uma cena. São as pessoas, os zines, os encontros, os grafites, os bares, os rolês e os espaços improvisados que mantêm o ecossistema vivo. A homenagem funciona como lembrança de que a história da música alternativa brasiliense é também a história de quem a documentou.

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