Duas vozes, um mar de histórias: LIA DE ITAMARACÁ e DAÚDE anunciam álbum conjunto batizado com bolero inédito de OTTO e PUPILLO

O aguardado disco “Pelos olhos do mar”, que reúne solos e duetos das duas artistas, tem lançamento previsto para 27 de novembro pelo Selo Sesc, e se inspira no bolero que dá nome ao álbum.

Redação - SOM DE FITA

10/28/2025

A parceria entre Lia de Itamaracá e Daúde marca um encontro de gerações e de referências distintas, mas igualmente ricas, no universo da música brasileira. A cirandeira pernambucana Lia de Itamaracá — reconhecida por seu trabalho com a ciranda e como uma figura central da cultura popular de Pernambuco — e a cantora baiana Daúde — celebrada por sua trajetória que une MPB, ritmos afro-brasileiros, pop e experimentalismo — uniram forças para dar vida a um álbum em dupla, cujo título Pelos olhos do mar já anuncia a amplitude simbólica e sonora do projeto.

O álbum deriva do show que as duas vêm apresentando desde 2023 em diversas cidades do país, levando o repertório e o diálogo musical delas para o palco, agora convertido em registro fonográfico. O disco foi batizado precisamente com o nome do bolero “Pelos olhos do mar”, composto por Otto em parceria com Pupillo Oliveira — tema inédito, que inaugura esse caminho conjunto das duas artistas.

A produção ficou a cargo de Pupillo, sob direção artística de Marcus Preto. O selo responsável pelo lançamento é o Selo Sesc, e a data marcada é 27 de novembro. Gravado no estúdio Da Pá Virada, em São Paulo, o álbum combina duetos e solos das duas, oferecendo ao ouvinte tanto o diálogo entre as vozes quanto os momentos individuais de cada intérprete.

O significado de “Pelos olhos do mar” e o bolero que nomeia o álbum

A escolha de batizar o álbum com “Pelos olhos do mar” revela uma vontade de estabelecer um imaginário — o mar, símbolo de travessia, encontro e memória — unido à sensibilidade das artistas. O bolero em si foi composto por Otto e Pupillo, nomes com forte presença no cenário da música contemporânea brasileira, o que dá à peça um frescor e um peso simbólico em simultâneo.

O bolero, gênero tradicionalmente associado ao romantismo latino ou à canção de atmosfera íntima, serve neste projeto como uma ponte: entre passado e presente, entre as raízes populares da ciranda (no caso de Lia) e as experimentações contemporâneas de Daúde. Ao nomear todo o álbum com esse bolero inédito, as artistas assumem que esse tema central carrega o espírito da colaboração, marca o início de uma nova fase e orienta o repertório que se seguirá.

Essa escolha reforça o caráter de descoberta que permeia o álbum: não apenas uma reunião de vozes, mas uma reunião de mundos sonoros e culturais que, apesar das diferenças — tanto geográficas quanto estéticas —, convergem em busca de uma música que respira tradição e modernidade ao mesmo tempo.

O repertório: solos que expressam trajetórias, duetos que constroem encontros

O repertório de Pelos olhos do mar mistura momentos de individualidade e de interação. Segundo as informações divulgadas:

  • A faixa-título “Pelos olhos do mar” foi gravada em duo pelas duas artistas.

  • A música “Quem é” — bolero composto pelo cantor Silvinho (1931 – 2019) em parceria com Maurílio Lopes, e lançado originalmente por Silvinho — aparece em versão solo de Lia.

  • Já Daúde interpreta sozinha “A galeria do amor” (1975), sucesso autoral do cantor e compositor Agnaldo Timóteo (1936 – 2021).

Essa estrutura revela a estratégia artística: dar espaço às vozes de cada uma, para que brilhem individualmente, e ao mesmo tempo construir a força da união no registro do duo.

Lia de Itamaracá e Daúde celebram a força da cultura popular e da musicalidade afrodiaspórica | Foto: Ytallo Barreto/Divulgação

Para Lia, que tem toda uma trajetória ligada às raízes da ciranda, este álbum representa uma vertente diferente — explorar um formato de dueto num contexto “mais fonográfico”, dentro de um estúdio. Por parte de Daúde, acostumada a transitar por diferentes estilos e plataformas, o álbum reafirma uma abertura para alianças artísticas que dialoguem com tradição, com percussão, com ciranda e com a cultura nordestina — tema que, aliás, vem ganhando novo fôlego no cenário contemporâneo.

Gravar em estúdio em São Paulo, com produção de Pupillo, sinaliza um processo de refinamento — não necessariamente “pop comercial”, mas com atenção aos arranjos, direção artística e mixagem. O resultado promete qualidade técnica e sensibilidade cultural, sem abrir mão da autenticidade.

Contexto das artistas e o impacto cultural da colaboração

Lia de Itamaracá (Maria Madalena Correia do Nascimento), nascida em Itamaracá (PE) em 1944, é uma das mais emblemáticas representantes da ciranda no Brasil. Sua trajetória inclui o reconhecimento como patrimônio vivo de Pernambuco, e ela tornou-se uma ponte entre a cultura popular e a música brasileira contemporânea.

Daúde (Maria Waldelurdes Costa de Santana Dutilleux), nascida em Salvador (BA) em 1961, construiu uma carreira marcada pela fusão de samba, funk, rap, MPB e experimentações, com forte componente de identidade negra e afro-brasileira. Formada em Letras e pós-graduada em História Africana, Daúde sempre trouxe à sua obra tanto a afinação estética quanto um compromisso com cultura, identidade e diversidade.

Quando duas artistas de perfis distintos e trajetórias fortes se unem, há naturalmente um impacto simbólico: síntese de gerações, de territórios (Nordeste, litoral, interior) e de sonoridades. Este álbum se situa num momento em que a música brasileira olha tanto para as suas raízes quanto para novas formas de colaboração.

O envolvimento de Otto e Pupillo — nomes que têm peso na música contemporânea — traz ao registro uma dimensão de “novidade dentro da tradição”: a composição autoral que revisita o bolero com arranjo moderno e produção refinada, entrelaçada à voz de uma cirandeira tradicional e à de uma artista cosmopolita.

Para o público, essa colaboração abre várias frentes: descobertas de repertórios como “Quem é” e “A galeria do amor”, aproximação de estilos que raramente se misturam (ciranda, bolero e MPB) e uma nova leitura para duas carreiras que continuam se renovando.

Um encontro de marés e memórias

Pelos olhos do mar surge como mais que apenas um registro de estúdio: é um encontro cultural, histórico e musical. É a união entre a força da tradição e a liberdade da experimentação. O mar, metáfora de passagem e de encontro, torna-se o elo que une Lia e Daúde — duas vozes que, mesmo vindas de margens diferentes, navegam na mesma corrente de sensibilidade e resistência artística.

O lançamento em 27 de novembro pelo Selo Sesc promete ser um dos momentos mais marcantes do ano para a música brasileira — não apenas pela sonoridade refinada, mas pela simbologia de duas artistas que representam, com força e elegância, o poder do encontro entre gerações, linguagens e territórios.

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