
DRAGÕES Contra GUERREIROS: A Épica Treta de Bastidores Entre MANOWAR e RHAPSODY
O início dos anos 2000 guardou uma das brigas mais inusitadas do metal: de um lado, o ego inflado do Manowar; do outro, a ousadia do Rhapsody, que se recusou a dobrar os joelhos para o “metal verdadeiro” proclamado por Joey DeMaio.
Redação - SOM DE FITA
9/15/2025






O final da década de 1990 trouxe consigo uma nova leva de bandas que mexeram com os rumos do metal. O Rhapsody, surgido na Itália, despontava como um fenômeno inesperado: ao invés de seguir a fórmula tradicional de riffs pesados e letras sobre batalhas, eles decidiram abraçar de vez o cinema, as trilhas sonoras e até a música erudita. Os discos da banda eram praticamente “óperas metalizadas”, com arranjos orquestrais, coros majestosos e narrativas que envolviam dragões, reis e profecias. Essa abordagem chamou atenção de fãs e da mídia, colocando o grupo como um dos grandes responsáveis por renovar o interesse no power metal.
Do outro lado, estava o Manowar, banda americana que desde os anos 1980 cultivava a imagem de guerreiros invencíveis do “true metal”. Com armaduras de couro, espadas e discursos sobre a pureza do gênero, Joey DeMaio e companhia se consideravam não apenas músicos, mas guardiões de uma fé metálica. A fundação da gravadora Magic Circle Music, por parte de Joey, parecia o movimento ideal: colocar sob sua asa uma banda que tinha potencial de ser a sucessora espiritual da grandiosidade épica que o Manowar sempre propagava. O casamento parecia perfeito — veteranos lendários apadrinhando jovens heróis de fantasia.
No entanto, como tantas alianças históricas, a realidade mostrou que um reino com dois reis dificilmente sobrevive. A ideia de unir forças para conquistar o mundo do metal se transformou rapidamente em uma disputa de egos, em que cada lado queria ser reconhecido como o verdadeiro arauto do épico.
O choque entre a visão hollywoodiana e o “true metal”
Se a aproximação entre as bandas parecia lógica, o conflito criativo era inevitável. O Rhapsody, comandado por Luca Turilli e Alex Staropoli, não tinha interesse em ser moldado como uma versão moderna do Manowar. Eles queriam algo próprio, maior do que a vida: álbuns que soassem como trilhas sonoras de cinema, misturando influências clássicas, barrocas e até elementos de música folclórica. Era a fantasia em sua forma mais pura, sem medo de parecer exagerada. Para muitos fãs, essa ousadia foi justamente o que tornou o Rhapsody diferente de qualquer coisa que havia no metal da época.
Joey DeMaio, no entanto, não parecia disposto a abrir mão de sua visão. Conhecido por centralizar decisões e por tratar o Manowar como uma religião particular, ele teria tentado influenciar os rumos artísticos do Rhapsody. Para Joey, o “verdadeiro metal” precisava ser firme, austero e, sobretudo, sob o selo da sua aprovação. O problema é que, para os italianos, essa tentativa de tutela soava como uma limitação criativa. O Rhapsody não queria ser apenas um discípulo; queria ser uma entidade própria.
Aqui mora a grande ironia da história: Joey, que subia aos palcos vestido como guerreiro de quadrinhos, parecia incomodado com o fato de outra banda usar o imaginário da fantasia de forma ainda mais extravagante. Era como se o mestre da espada tivesse se ofendido porque os dragões estavam roubando sua coroa de metal épico.
Indiretas afiadas, festivais tensos e a novela das vaidades
O rompimento oficial com a Magic Circle Music foi apenas o primeiro capítulo. A partir daí, cada entrevista do Manowar parecia um campo minado. Joey soltava frases que, para qualquer fã minimamente atento, eram indiretas certeiras contra o Rhapsody. Comentários como “bandas que não respeitam o verdadeiro metal” ou “músicos que preferem viver em fantasias” eram repetidos em revistas especializadas e, claro, alimentavam as especulações da cena.
Nos festivais europeus, onde ambos os grupos se apresentavam, os boatos de camarim corriam soltos. Há quem diga que houve discussões pesadas, com integrantes batendo boca e assessores tendo que intervir. Outros falam até em quase confrontos físicos — embora nada nunca tenha sido confirmado oficialmente. Mas, no imaginário do fã de metal, a ideia de Joey DeMaio e Luca Turilli trocando farpas em um backstage de festival já era suficiente para render memes, piadas e discussões calorosas em fóruns online da época.
O mais curioso é que, enquanto o Rhapsody parecia seguir em frente, focado em construir seu universo musical grandioso, o Manowar insistia em reafirmar sua posição como guardiões supremos do gênero. Para quem via de fora, a impressão era que Joey não suportava dividir os holofotes com outra banda que também se levava a sério em sua grandiosidade épica. Afinal, se há algo mais poderoso que uma espada flamejante, é um ego que acredita ser maior que qualquer dragão.
O legado de uma batalha que virou piada entre fãs
Duas décadas depois, a famosa treta entre Manowar e Rhapsody ainda é lembrada mais como anedota do que como tragédia. O Rhapsody seguiu seu caminho, alterou o nome para Rhapsody of Fire em 2006 por questões legais, lançou discos aclamados e manteve uma base de fãs apaixonada, especialmente na Europa e no Japão. Sua ousadia estética nunca agradou a todos, mas garantiu um espaço único no hall do power metal.
Já o Manowar continua sendo um fenômeno à parte. Seus shows seguem grandiosos, com direito a discursos inflamados de Joey DeMaio, que ainda insiste em se posicionar como o sumo sacerdote do metal verdadeiro. Para alguns, isso é inspiração; para outros, motivo de riso. Mas o fato é que a banda sobrevive, sustentada por sua devoção inabalável a uma estética que nunca se dobra às modas.
O episódio com o Rhapsody acabou se transformando em símbolo do que acontece quando dois universos grandiosos colidem. Em vez de conquistarem juntos o trono do metal épico, acabaram criando uma narrativa paralela — um mito de bastidores que até hoje é citado como exemplo de como o ego, quando maior que os próprios amplificadores, pode transformar uma parceria promissora em novela. E, convenhamos, para uma cena que sempre viveu do exagero, nada mais coerente do que essa história se tornar uma das mais divertidas lendas do metal.
Manowar. Crédito: Divulgação/Mercury Concerts/Eric Joey
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